A Água é um elemento imerso em Simbologias e Poderes tão fascinantes que se perpetuam através dos tempos. Que a água é vital para a sobrevivência, todos sabemos. E quanto aos Mistérios que ela guarda, o quanto conhecemos? O Sagrado Feminino é envolto em água, que purifica e renova a vida, sendo retratado por diversas culturas em mitos e narrativas heróicas. A água também reflete os aspectos emocionais da existência e pode ajudar manter nosso equilíbrio interior. Vamos conhecer um pouco as propriedades espirituais da Água e como fazer bom uso delas no dia a dia.
Desde os primórdios da formação das sociedades humanas, a água está presente em mitos e ritos de diversas culturas e religiões. E a razão para tal não é difícil de compreender. O conhecimento empírico, baseado na observação dos fenômenos naturais e nas experiências individuais e coletivas, era o impulsionador de saberes e crenças dos grupos sociais em suas variadas etapas evolutivas. Ele precede o conhecimento que a ciência nos propicia hoje e é impressionante como muitas vezes eles se complementam.
As sociedades primitivas não faziam ideia de que aproximadamente 70% do planeta era composto de água, ou que o mesmo percentual era encontrado em seus próprios corpos. Ainda assim, sabiam perfeitamente que a Água e a Vida estavam fortemente relacionados, pois sem a água a terra seca, os seres vivos definham e a desesperança se alastra na comunidade. O excesso ou a fúria das águas também era fonte de preocupações e tormentos, sendo, portanto, compreendido como um sinal divino de insatisfação com aquele coletivo.
Havia um mistério ainda mais marcante para fortalecer essa correlação Água-Vida: o fenômeno do nascimento. Nascemos no rompimento das águas, no fluir do líquido amniótico que nos abrigou e permitiu nosso desenvolvimento dentro de um corpo feminino. Somente a mulher era capaz de verter sangue mensalmente sem morrer, e somente ela era capaz de gerar a nova vida em uma “bolsa de água”. Em tempos onde a sobrevivência era um enfrentamento constante de adversidades, essas características vitais para a perpetuação da espécie sacralizaram o feminino.
Em diversas culturas antigas e tradições nativas, o Princípio Feminino era representado pela água, em suas diversas manifestações, e regido pela Lua. E esse Feminino Sagrado era venerado como a fonte das águas que sustentava a vida, seja caindo dos céus em forma de chuva para fertilizar a terra, ou brotando da terra como fonte, rio ou lago, ou ainda concedendo as bênçãos dos mares para pescadores e navegantes. Ainda hoje encontramos registros de rios sagrados em diversas partes do mundo, como é o caso do Rio Òṣún ,consagrado ao Oriṣá Òṣún, na Nigéria. Para os iorubás, Òṣún reside no fundo daquele rio, sendo criadora de vida, a que traz peixes para as águas e fertilidade para as mulheres. Vejamos um de seus mitos que trata do reconhecimento do Poder Feminino das águas e da necessidade de equilíbrio entre as polaridades masculino-feminino:
Obatalá reuniu todos os Oriá¹£ás Oborós, as divindades masculinas iorubanas, e propôs a estes Deuses formar uma sociedade de Oriá¹£ás.
Òá¹£ún quando soube ficou muito ofendida. Foi até eles e perguntou:
“Eu também sou Oriá¹£á, porque me excluem?”
Todos os Oborós riram e disseram:
“Desde quando precisamos de mulheres? Não estão à nossa altura.”
Òá¹£ún então decidiu que se não precisavam dela, ela retiraria o seu Aá¹£é do mundo. Não havia mais fertilidade, as mulheres não engravidavam, a água não matava mais a sede e a natureza secou.
Os Oborós foram reclamar a Eledumaré, querendo que ele obrigasse Òá¹£ún a dar seu Aá¹£é novamente. Com muita sabedoria, Eledumaré disse:
“Vocês disseram a Òá¹£ún que ela não é importante e agora sofrem sem ela. Devem desfazer esse erro.”
Todos os Oborós foram às margens de Rio Òá¹£ún e levaram oferendas para Iyabá, que logo surgiu das águas e perguntou:
“Por que estão chamando meu nome se eu claramente não estou à altura de vocês?”
Òá¹£ún fez com que os Oborós implorassem seu retorno, e quando ela aceitou voltar, impôs a condição de que ela e as outras Iyabás também tivessem voz ativa entre os Deuses.
E assim foi feito, a terra voltou a prosperar e Òá¹£ún foi chamada Iyalodê, a mulher honrada.
Em diversas culturas encontramos narrativas de Deidades Femininas () surgidas de meios aquáticos, que são considerados seus domínios e permanecem como referência de culto. Algumas se tornaram bastante conhecidas até os dias atuais, como Afrodite, a deusa grega da beleza e do amor, nascida das espumas do mar; Ísis, a Deusa Mãe egípcia de imensos poderes curativos, que nasceu nos pântanos do Nilo; a chinesa Ehuang, uma das deusas associadas ao rio Qiantang; o rio Ganges na Índia é considerado sagrado por ser a personificação de Ganga, a deusa hindu capaz de limpar o carma ruim de qualquer pessoa; Juturna é a deusa romana das fontes e dos poços; Styx é a deusa grega que governa o rio que tem seu nome e separa os vivos dos mortos.
Outras Deidades são descritas como “Aquelas que deram origem ao fluir das águas”, algumas vezes sacrificando a si mesmas no processo, como é o caso da Deusa Boann, que habita o rio Boyne na Irlanda, e é homenageada no maior monumento megalítico do país e da Europa, o Brugh na Boinne, ou NewGrange, construído em torno de 3200 antes da Era Cristã. O mito de Boann, a Sempre Cheia, nos apresenta como a Deusa desafia a imposição patriarcal, retomando para si a Soberania e assumindo sua função sagrada de mantenedora da vida. Seu sacrifício levou a fertilidade e a inspiração ao Vale do Boyne. As águas do rio Boyne, assim as do místico Poço de Segais, ainda hoje são consideradas sagradas e usadas para fins ritualísticos.
O Dindsenchas conta que Boann foi proibida por seu marido, Nuanda, de se aproximar do Poço de Segais, também conhecido como o Poço da Sabedoria. A fonte mágica teria sido o dote que o Rei Nuanda recebeu ao se casar com a Deusa.
O poço era circundado de aveleiras, e quando as nozes de avelã caiam dentro dele, eram rapidamente comidas pelo salmão pintado que ali vivia. Na simbologia céltica, a Aveleira e o salmão representam a inspiração, a sabedoria e a ligação ancestral.
Inconformada por ser impedida de se aproximar e se banhar nas águas purificadoras do poço, Boann desafiou o poder contido naquela fonte primordial, caminhando entorno dele contra o sentido do relógio. Isso causou o furor das águas, que engrossaram violentamente e se expandiram, fluindo na direção do mar e criando o rio Boyne.
Nesta catástrofe, o corpo de Boann foi destruído pela enxurrada, e sua essência passou habitar o rio, tornando-se Boann, a Sábia, Deusa da Soberania do Vale do Boyne.
Na mitologia celta, as divindades da água eram muito populares e respeitadas, pois seu elemento era a essência da própria vida. Suas vontades se manifestavam no movimento espontâneo e às vezes imprevisto dos mananciais, rios e lagos. Eram Deusas tanto acolhedoras quanto guerreiras, assim como as águas podem ser serenas ou turbulentas. As tribos celtas não conheciam o conceito de sustentabilidade, ainda assim o praticavam em seus cotidianos, acreditando na necessidade vital de preservação e equilíbrio do ecossistema. Nesse aspecto, eles se assemelham com as tradições indígenas brasileiras. Ainda que distantes no tempo e no espaço, essas culturas respeitam a água e os demais elementos da natureza como sagrados.
Segundo Kaká Werá Jecupé , escritor, ambientalista e conferencista indígena brasileiro do povo tapuia:
“A água é a segunda divindade para os Tapuias e se posiciona ao Sul. Seu nome é Iaci, uma das formas que a respiração do universo assumiu para conduzir a vida. A água para os indígenas é a Grande Mãe, pois ela participa na manifestação da vida em cada coisa com seu amor incondicional. Herdamos da água a habilidade do sentir e das emoções. A água é o sentimento divino materializado.”
A Lenda Sagrada de Iaci diz que toda mulher que tocasse em um armamento de guerra ou caça, era punida com a morte. Essa opressão gerou um misto de curiosidade e indignação no sexo feminino. Um dia, algumas índias se rebelaram, tomaram o arco e a flecha para si, cortaram seus cabelos com facas e lançaram os fios ao chão, e então partiram, abandonando seus afazeres domésticos.
Depois de muito andar, atravessar precipícios, vencer rios e cortar a floresta densa encontraram um recanto do éden onde múltiplas orquídeas desabrocharam celebrando sua chegada. Ali era a morada de Iaci, Mãe dos Lagos e Enfermeira dos Corações Doentes. As mulheres nomearam o local de Iaci-Taperê, que significa Serra da Lua, e lá construíram seu reino, auto intitulando-se Icamiabas . O lago que havia abaixo da Serra elas batizaram como Iaci-Uaru, o Espelho da Lua.
Ao retornar da caça, os índios encontraram suas casas abandonadas e reviradas. Isso os fez sentir um grande pesar, surpresa e arrependimento. Partiram então desesperados a procura das fugitivas de sua tribo. Assim como as mulheres, eles também passaram por grandes desafios até finalmente encontrarem Iaci-Taperê.
Lá chegando, foram recebidos com grande hostilidade pelas mulheres, que os expulsaram com violência. Sem ter para onde ir, permaneceram às margens do Iaci-Uaru, até que a grande Iaci surgiu em toda sua glória, e por sua intervenção divina, as mulheres decidiram dar uma chance aos homens, desde que passassem pela Jornada Expiatória.
Reunidas em torno do Lago Sagrado, nas noites de Lua Crescente ou Cheia, as Icamiabas celebravam a festa de Iaci, a "Mãe do Muiraquitã", que habitava o fundo da lagoa. Entoando cânticos que nenhum homem jamais poderia ouvir, elas se preparavam para buscar a purificação suprema das águas cristalinas do Espelho da Lua, em cujo fundo se visualizava as pedras verdes. Mergulhando fundo, elas voltavam à superfície trazendo em suas mãos as pedras consideradas joias sagradas, que lhes eram presenteadas por Iaci como penhor da sua consagração.
Ao fim das celebrações de Iaci, as Icamiabas buscavam seus pretendentes e os levavam para suas tendas para aliviar o fogo que os queimavam pelo afastamento. Contudo, no dia seguinte, os índios eram novamente expulsos. Aquelas que geravam índias mantinham suas crias até se tornarem novas Icamiabas, porém os meninos que nasciam eram entregues aos cuidados dos homens, para que se tornassem bravos caçadores e guerreiros, todavia longe dos braços de Iaci.
Uma das mais significativas propriedades espirituais da Água é a Purificação. A água purifica nossos corpos e nossas almas, e muitas das fundamentações desse princípio purificador estão relacionadas as Águas Primordiais, consideradas a origem da Vida. Em diversos ritos encontramos referências de banhar nas águas como ato de purificação e renascimento, inclusive no batismo. É pela água que limpamos nossos corpos físicos e seguindo esse mesmo princípio, com ela também podemos nos limpar de energias indesejadas. Benzedeiras até hoje se utilizam tão somente de água e ervas para suas limpezas energéticas. Desde ritualísticas mais simples até as mais cerimoniais, a água é de suma importância. No final desse artigo você vai encontrar algumas dicas de como usar tão somente a água a seu alcance para se livrar de energias ruins.
Outro aspecto relevante é o Equilíbrio. A energia feminina, ou o yin para os chineses, é a polaridade essencialmente receptiva, fluida, emocional, capaz de se mover em várias direções. É a água. É o elemento que trabalha as emoções. E que, dentro de nossos corpos, são afetadas por nossos estados emocionais, somatizando nossas frustrações, raivas, mágoas, medos, inseguranças, ou qualquer outro abalo emocional não curado. Já acumulou aborrecimentos e sua pressão arterial se elevou? É resultado físico do desequilíbrio emocional, é a água dentro de nós avisando que estamos no limite. E usando da própria água podemos buscar a cura, o equilíbrio, a harmonização e o aconchego que nos envolveu antes de respirarmos pela primeira vez. Ela é um elemento que nutre a vida, nos ensinando e inspirando por meio de suas propriedades físicas e simbolismos espirituais.
1. Flexibilidade – nos ensina como sermos maleáveis e não rígidos. Seu grande poder de adaptabilidade faz com que ela se molde ao recipiente em que é colocada.
2. Perseverança – apesar de suave na consistência ela demonstra sua potencialidade com o ditado: “Água mole em pedra dura tanto bate até que fura”, ou seja, ela não desiste e alcança seus resultados através de sua constância.
3. Diversidade – pode ser encontrada nas formas líquida, gasosa ou sólida (gelo) e em cada uma delas mantém sua essência (H2O) se adaptando conforme a circunstância de calor ou frio. Sua diversidade também é vista na forma do mar (água salgada) e numa infinidade de formações de água doce: rios, lagos, riachos, cachoeiras, poços, chuva etc.
4. Aceitação – o oceano abraça a todos os tipos de rios dentro dele sem julgar ou discriminar: rios limpos, rios poluídos, rios maiores, rios menores, mais ou menos bonitos. Para o oceano todos os rios são iguais e encontram espaço em seu seio.
5. Guardar segredos – o mar ou o rio engole o que entra nele e não revela à superfície o que contém em seu interior profundo. Como um sábio que funde o que vê e o que ouve e não espalha os erros de uns para outros na atmosfera, mas silencia e dissolve.
6. Capacidade de harmonizar – diz o ditado que após a tempestade vem a bonança. Mesmo após uma enchente ou um maremoto as águas voltam a se tornar serenas e tranquilas, recuperando o seu equilíbrio.
7. Neutralidade – quem pratica esportes na água experimenta grande felicidade e alegria. O prazer de surfar, velejar, nadar demonstram isto. O oposto também é verdadeiro para quem teve a vida de um ente querido roubada pelo mar. O mar ou o rio não criam nossa felicidade ou tristeza. São neutros. São apenas o ambiente, o meio, onde as situações acontecem. Esta neutralidade nos remete à questão da responsabilidade pessoal pelo que acontece conosco em vez de culparmos os outros.
8. Excelente condutor – de pessoas e mercadorias ao seu destino como meio de navegação; condutor de substâncias diversas como medicamento, corantes, ou qualquer outra coisa solúvel. A água humildemente se esconde e permite-se ser usada como condutor para um sabor no caso de uma bebida (chá, café etc.), como remédio em variadas formas (soro, injeção, xarope, soluções diversas), na indústria cosmética (perfumes, cremes, shampoos etc.), na indústria alimentícia, quando um pó ou mistura ao ser adicionado água vira bolo, sopa, pudim etc. Esta é a generosidade da água, que serve a uma infinidade de propósitos.
Compartilho com vocês algumas atividades simples, até cotidianas, e que podem revigorar suas energias.
Nós costumamos nos banhar com pressa, devido as próprias correrias do dia-a-dia. E com isso não nos conectamos com a água que flui no banho. Então experimente fazer isso quando chegar em casa, quando puder ter um tempo para si. Prepare seu banho da maneira que lhe seja confortável, pode ter uma música ambiente, ou aromatizar seu banheiro com incensos. Após se lavar das impurezas físicas, feche os olhos e visualize a água que corre em seu corpo levando toda energia pesada. Entregue para a água suas preocupações e aborrecimentos daquele dia e sinta como ela é capaz de renovar nosso ânimo e clarear nossas mentes.
Fazer faxina pode ser uma forma de purificar ambientes. Para isso precisamos tornar essa tarefa prazerosa, porque quando a executamos com irritação, pressa, desgosto, são esses sentimentos que fazemos vibrar na água, e que vão ser impregnados no local. Escolha um dia bom, não se apresse, perceba sua casa ou local de trabalho/estudo como um espaço acolhedor. Se quiser colocar uma fragância que goste na água que vai usar, você se sentirá ainda mais conectado. Perceba que ao final da limpeza a energia vibratória do local está renovada.
Mergulhar todo o corpo em uma banheira ou piscina, fechar os olhos e ficar só sentindo o movimento da água que te envolve é um excelente recurso para equilibrar emoções. É como voltar ao aconchego do útero.
Só de mergulhar os pés em água morna, você vai sentir um enorme relaxamento. Melhora se colocar uma música suave. Você pode usar para purificação fechando os olhos e visualizando todo carga escura saindo pelos seus pés e ficando na água. Você pode acrescentar nessa água: Sal grosso, ervas, óleos essenciais, que as propriedades condutoras da água vão se unir as propriedades de cada elemento acrescentado.
Colete água da primeira chuva do ano com uma concha e dê para criança beber. Logo ela estará dizendo suas primeiras palavras
Em um copo d'água coloque a quantidade de grãos de arroz que represente os quilos que você quer emagrecer. Cubra e deixe descansar por toda à noite, e beba essa água em jejum assim que levantar.
Espero que esse artigo te ajude a compreender as razões de entendermos a Água como elemento Sagrado, e que vocês possam usar plenamente as propriedades espirituais dela no seu dia a dia. Vou me despedir de vocês com uma linda música.